sábado, outubro 20, 2007

ABUSIVIDADE NA COBRANÇA DAS TAXAS DE JUROS DE MERCADO

São inúmeros os laudos entregues nas varas judiciais pelo nosso rincão brasileiro afora, sem a devida e clara conclusão técnico-financeira, que irá auxiliar na elucidação das eventuais dúvidas dos louvados magistrados no momento oportuno de prolatar a tão esperada sentença.
Como forma de auxiliar os experts na elucidação destas questões, mister se faz navegar nos mares bravios das indecisões dos tribunais, colhendo as principais decisões pacíficas (ou quase) sobre as teses para uma redução justa das taxas de juros aplicadas nos cheques especiais e cartões de crédito.
Especialmente agora quando houve a revogação do Art. 192, inciso VIII, § 3.º que limitava os juros no teto de 12% ao ano.
A jurisprudência do STJ e outros egrégios tribunais tem sido na manutenção da limitação dos juros no teto dos 12% quando a lide envolve as operações de cheque especial anterior a Ementa 40/2003.
Na prática, a aparente vitória das instituições de crédito financeiro nas ações que envolvem a polêmica dos elevados juros do cheque especial é, deveras, aparente. Pois com a utilização conjunta das normas infraconstitucionais, ainda não revogadas, somando-se às súmulas 30 e 296 do STJ, e súmula 121 do STF, afirma-se, tecnicamente, que os juros não poderiam ultrapassar os 2% a 3,0% ao mês, para o cheque especial e cartão de crédito.
Há diversos estudos do Banco Central que buscam elucidar a problemática: por que os juros no cheque especial são tão elevados? Além destes estudos, apresentam-se tabelas comparativas de instituições financeiras que sobrevivem e auferem bons lucros com a cobrança de juros entre o patamar de 2% e 3%.
Quanto à proibida cumulação da comissão de permanência com a correção monetária, juros moratórios, remuneratórios e multa, evidencia-se a colossal abusividade na cobrança de encargos financeiros e de taxas de juros em desarmonia com o bom senso e razoabilidade do próprio mercado financeiro brasileiro.
Vamos analisar, tecnicamente, o teor dessas súmulas e analisar se há benefício real ou não na redução das taxas de juros e comissão de permanência, demonstrando mais claramente as evidências de extorsão e abusividades.
É importante considerar que as taxas de juros são formadas pelos DIs (Depósitos Interfinanceiros) mais taxa de rentabilidade de até 10% ao mês, encargos tributários (IOF, PIS, CONFINS, IRPJ, etc).
Considerando, porém, as taxas médias de mercado formadas pelos DIs, percebe-se que nos últimos dez anos a média ficou em 1,51% ao mês, mas alguns bancos chegaram a cobrar no mesmo período cerca de 8,5% ao mês, como é o caso do Banco do Brasil.
Se a jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça já se pacificou no sentido de que não há que se falar em limitação das taxas de juros de mercado, considerando óbice pela Súmula 596 do STF, dentre outras colocações doutrinárias, mas se houver discrepância das taxas de juros de mercado, considerando a média de mercado, então as taxas de juros devem ser revisadas, inclusive se ficar demonstrados lucros exorbitantes das instituições financeiras, conforme Recurso Especial Nº 612.876 - RS (2003/0211399-7), com relatoria do Exmo. Sr. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, que assim de pronunciou, verbis:
“(...) que os juros sejam cobrados à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central, (...)”.
O STJ também no REsp 909.712 - RS (2006/0270609-5 - relator Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA), assim se pronunciou, verbis:
“(...) O FATO DE AS TAXAS DE JUROS EXCEDEREM O LIMITE DE 12% AO ANO, POR SI SÓ, NÃO IMPLICA ABUSIVIDADE, SENDO PERMITIDA A SUA REDUÇÃO, TÃO SOMENTE, QUANDO COMPROVADO QUE DISCREPANTES OS JUROS PACTUADOS EM RELAÇÃO À TAXA DE MERCADO (...)”.

Ainda no mesmo Recurso Especial, o relator Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, assim declarou, verbis:

“(...) no REsp 407.097/RS, publicado no DJ 29.09.2003, PROCLAMOU QUE A ALTERAÇÃO DA TAXA DE JUROS PACTUADA DEPENDE DA DEMONSTRAÇÃO CABAL DA SUA ABUSIVIDADE, EM RELAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO (...)”.
Pretende-se deixar bem claro que quando se fala em média de mercado, deve-se entender "o que é mercado" e como se formam suas taxas de juros básicas.
A questão adentra no campo econômico-financeira, sem sombras de dúvidas.
Mas considerando o Ordenamento Jurídico ditado pelo STJ, limitando a cobrança das taxas de juros aplicadas ao cheque especial praticada pelo mercado, deve-se primeiramente entender quem é este Mercado?
O Dicionário de Finanças da Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA) define bem o vocábulo financeiro:
“1) Conjunto de atividades de compra e venda de determinado ativo financeiro, com fluxo expressivo e continuado de operações.2) conjunto de atividades relacionadas às operações com ativos de características semelhantes - mercado de renda variável, mercado de renda fixa pública, mercado de renda fixa privada e outros”.

O termo genérico mercado está intimamente relacionado ao mercado aberto [1]:

“Mercado de compra e venda de títulos públicos orientado e fiscalizado pelo Banco Central.
Instrumento de política monetária para expandir ou contrair as disponibilidades em dinheiro no mercado financeiro, e otimizar a liquidez da economia”.

Agora, como já se sabe a definição de mercado e mercado aberto, mister se faz relembrar que as taxas de juros praticadas pelo mercado são determinadas pelos CDIs (Certificados de Depósitos Interfinanceiros), os quas são formados pelas Dis, definidas como:
“Taxa porcentual da média diária das operações no mercado interfinanceiro.
A taxa DI se forma a partir da taxa SELIC projetada para o dia D + 1, acrescida de:
a) custo dos impostos incidentes na operação
b) custos operacionais da instituição
c) lucro da instituição”. [2]

A taxa SELIC [3] define-se:
“1) Taxa básica de juros da economia brasileira, fixada periodicamente pelo COPOM - Comitê de Política Monetária do Banco Central.
2) taxa apurada no Selic, obtida mediante o cálculo da taxa média ponderada e ajustada das operações de financiamento por um dia, lastreadas em títulos públicos federais e cursadas no referido Sistema na forma de operações compromissadas.
EnFin. Neste caso, as operações compromissadas são operações de venda de títulos com compromisso de recompra assumido pelo vendedor, conjugadamente com compromisso de revenda assumido pelo comprador, para liquidação no dia útil seguinte.
Estão aptas a realizar operações compromissadas, por um dia útil, fundamentalmente as instituições financeiras habilitadas, como os bancos comerciais, bancos de investimento, corretoras e distribuidoras de valores.
Segundo o Banco Central, “as taxas de juros relativas às operações em questão refletem, basicamente, as condições instantâneas de liquidez no mercado monetário (oferta versus demanda de recursos).
Estas taxas de juros não sofrem influência do risco do tomador de recursos financeiros nas operações compromissadas, uma vez que o lastro oferecido é homogêneo.
Como todas as taxas de juros nominais, por outro lado, a Taxa Selic pode ser decomposta ex-post, em duas parcelas: taxa de juros reais e taxa de inflação no período considerado.
A Taxa Selic, acumulada para determinados períodos de tempo, correlaciona-se positivamente com a taxa de inflação apurada ex post”.

Portanto, se aplicarmos as taxas razoáveis de mercado, mais um spread de 1% ao mês, as reais taxas de juros de mercado, em especial as cobradas no cheque especial, não deveriam ultrapassar 2,7% ao mês, nos últimos dez anos.
Infere-se ainda que a maioria das demandas judiciais infrutíferas são as que possuem laudos periciais judiciais inconclusos ou totalmente parciais. Mister se faz a adequação dos laudos periciais à realidade econômico-financeira, garantindo cobranças de juros de mercado razoáveis, de preferência pelas taxas mínimas informadas pelo Banco Central.
Acrescenta-se, para melhor elucidação da problemática dos juros abusivos que as taxas de juros de mercado no cheque especial são incompatíveis também com a taxa de equilíbrio.
O economista inglês J. M. Keynes definiu a taxa de equilíbrio como aquela associada ao nível de emprego de equilíbrio, que poderia não ser compatível com o pleno emprego.
Teoricamente a taxa de equilíbrio, em outros países, situa-se próximo de 1% a 2 % ao ano.
No Brasil, situa-se entre 8,5% e 10% ao ano, o que singulariza a economia brasileira.
Entre as causas possíveis, economistas realçam que o problema possa estar, de alguma forma, ligado à estrutura da formação da taxa de poupança no Brasil, muito dependente de poupança compulsória, ou falta de confiança no padrão monetário.Claro está que as taxas de juros de mercado aplicadas nas operações de crédito denominadas "cheque especial", pelo menos nos últimos dez anos, são abusivas, tendo em vista que as taxas básicas de juros, como SELIC e DIs, ficaram em média, neste período, em torno de 1,51% ao mês (Out/1997 a Set/2007).

sábado, março 11, 2006

Cheque especial - juros máximo de 12% ao ano - ex-TA/PR

CONTRATO BANCÁRIO. TAXA DE JUROS. ANATOCISMO. CADASTRAMENTO. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. VALOR. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE
Não estabelecendo a cláusula contratual critérios claros e objetivos para a taxa de juros, antes permitindo variação unilateral desta, o Banco não pode cobrar juros superiores a 12% (doze por cento) ao ano.A capitalização de juros é vedada no contrato de conta-corrente.Ocorrendo o cadastramento indevido do correntista, deve o Banco compensar o dano moral, incidindo a correção monetária da data da sentença que fixou o respectivo valor em salários mínimos.Apelação provida em parte Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 275.252-9, da Comarca de Curitiba, 7.ª Vara Cível, em que é apelante HSBC Bank Brasil S.A. Banco Múltiplo e apelado Marcelo Denkerz.Acordam os Juizes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Paraná, por unanimidade de votos, em prover em parte a apelação, nos termos deste julgamento.§ 1. Marcelo Denker pretende a revisão de contratos bancários celebrados com HSBC Bank Brasil S.A. - Banco Múltiplo.Para tanto sustenta que por uma série de problemas viu-se forçado a utilizar o limite da sua conta-corrente, contratando posteriormente, para a cobertura do saldo devedor, dois empréstimos junto ao réu. Segundo ele, os juros cobrados superam patamares razoáveis, contrariando a Constituição Federal e o sistema jurídico em geral na medida em que eles vêm previstos em cláusulas potestativas, isto é, em cláusulas que permitem a alteração unilateral da sua taxa pelo Banco, além de terem sido capitalizados. Sustenta, por fim, que foi cadastrado pelo Banco, causando-lhe isso dano moral, que deve ser indenizado, e os valores que lhe foram cobrados indevidamente deverão ser restituídos tal como estabelece o artigo 42 do Código do Consumidor.O réu contestou sustentando, em resumo, que os contratos bancários admitem cláusulas como as pactuadas, além do que os juros não estão limitados para os Bancos. Sustenta ainda a ausência de capitalização, a impossibilidade jurídica do pedido de restituição e a necessidade da prevalência da pacta sunt servanda, além de discutir questão relacionada à antecipação de tutela.Após produção de prova pericial, o MM. Juiz acolheu integralmente os pedidos, condenando o réu, ainda, ao pagamento de indenização por dano moral, fixada em trinta (30) salários mínimos.O réu recorre dizendo que os juros fixados na r. sentença, de 6% (seis por cento) ao ano, não podem prevalecer, porquanto a atividade bancária é diferenciada e deve ser remunerada segundo o que ocorre no mercado. Sustenta que não houve capitalização de juros, que a cláusula 9.0 do contrato não é nula e que não estão presentes os requisitos para a restituição dos valores. Por último, quanto ao dano moral e ao cadastramento, diz que aquele não está caracterizado e que este foi legitimamente realizado; e quanto aos juros e correção monetária, entende que o MM. Juiz fixou-os incorretamente.O recurso foi contra-arrazoado.É o relatório.§ 2. O MM. Juiz: (i) excluiu a capitalização de juros, (ii) reduziu a taxa de juros para 6% (seis por cento) ao ano no contrato de abertura de crédito, (iii) reduziu a multa moratória para 2% (dois por cento); (iv) condenou o réu a restituir ao autor os valores cobrados a maior e ao ressarcimento do dano moral (30 salários mínimos), com juros de mora e correção monetária a contar da citação inicial.De acordo com o HSBC, no entanto:a) mesmo que os contratos não estabelecessem a taxa correspondente, os juros não poderiam ser nunca de apenas 6% (seis por cento) ao ano, sob pena de, entre outras coisas, inviabilizar-se a atividade financeira;b) a taxa de juros é informada ao correntista quando da contratação das operações de crédito especial, pelo sistema Telebanco, Caixas Automáticas e/ou Sistema Home Bank;c) a capitalização de juros é permitida pelo ordenamento jurídico;d) as condições contratuais foram livremente pactuadas, sendo, portanto, perfeitamente válida a cláusula 9.0 do contrato;e) não estão presentes os requisitos do pagamento indevido, da repetição dos valores cobrados a maior;f) o cadastramento do autor foi legítimo;g) a indenização do dano moral foi excessivamente fixada;h) a correção monetária e os juros de mora devem incidir somente a contar da sentença condenatória, não da citação;i) não cobrou multa moratória.2.1. Contrato bancário. Contrato de consumoTodas as questões, sem exceção, e principalmente as questões relacionadas a uma suposta norma permitindo o anatocismo, dependem do enquadramento ou não contrato bancário entre os contratos de consumo ou exclusivamente de direito comercial, decorrendo da opção por um ou por outro sistema conseqüências relevantes quanto ao dever de informar e ao equilíbrio que deve existir entre consumidor e fornecedor (muito embora, pela redescoberta dos deveres acessórios de conduta e pelo princípio da justiça contratual, os primeiros decorrentes da boa-fé objetiva e com implicações no desenvolvimento do princípio constitucional da solidariedade, o dever de informação e a necessidade de equilíbrio entre prestação e contraprestação não sejam restritas ao campo do Direito Consumidor, mas normas obrigatórias e adequadas a todo o Direito dos Contratos).Para que se tenha uma relação de consumo são de regra necessários o elo consumidor-fornecedor (artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor) e o elemento teleológico, ou seja: (a) alguém que adquira o produto ou o serviço como destinatário final, para uso privado, não para insumo ou para recolocá-lo, ainda que indiretamente, mediante transformação ou aproveitamento econômico, no mercado; e (b) outrem (mesmo ente despersonalizado) que autue regularmente desenvolvendo atividades de produção, montagem, criação etc. Mas independentemente do destino econômico do produto ou do serviço pode existir, em certas circunstâncias, uma relação de consumo, ou por equiparação ou pela peculiaridade de certos contratos. O próprio Código de Defesa do Consumidor, por exemplo, equipara ao consumidor certas pessoas submetidas a práticas por ele mesmo definidas como de consumo, como a atividade bancária, financeira, de crédito, securitária (artigos 3º e 29), ainda que falte o consumidor destinatário final. Também, como decorrência dos princípios constitucionais que definem a ordem econômica e financeira (ordem que deve obedecer à função social da propriedade, a redução das desigualdades, por exemplo -- artigo 170 da Constituição Federal) e daqueles que estruturam a República e a sociedade civil (como os princípios da justiça, da solidariedade, da dignidade da pessoa humana, este um valor fundamental e um princípio fundante de toda a ordem jurídica -- artigos 1º e 3º da Constituição Federal) e que exigem a tutela do hipossuficiente e um tratamento do contrato adequado à sua finalidade social, os princípios e as regras do Código de Defesa do Consumidor aplicam-se sempre que frente a frente estiverem contratantes técnica, jurídica e economicamente desnivelados, como imperativo de uma nova ordem social (teoria maximalista).Nesse sentido:a) o CDC regula situações em que haja 'destinatário final' que adquire produto ou serviço para uso próprio sem finalidade de produção de outros produtos ou serviços;b) regula também situações em que haja 'destinatário final' que adquire produto ou serviço com finalidade de produção de outros produtos ou serviços, desde que o produto ou serviço, uma vez adquiridos, sejam oferecidos regularmente no mercado de consumo, independentemente do uso e destino que o adquirente lhes vai dar;c) o CDC não regula situações nas quais, apesar de se poder identificar um 'destinatário final', o produto ou serviço é entregue com a finalidade específica de servir de 'bem de produção' para outro produto serviço ou serviço e via de regra não está colocado no mercado de consumo como bem de consumo, mas como de produção; o consumidor comum não o adquire".1 E por um ou por outro caminho, assim, chega-se à caracterização do contrato de conta-corrente e dos outros contratos de empréstimo dos autos como sendo de consumo:a) existe uma operação bancária, expressamente submetida ao Código do Consumidor;b) as partes estão em evidente desequilíbrio no contrato, circunstância que justificaria, de per se, a aplicação do mesmo código ainda que por analogia.c) mesmo para os que insistem na necessidade de um consumidor destinatário final nos contratos bancários, ou seja, que o produto ou o serviço destine-se ao uso privado do cliente, não ao incremento da sua atividade empresarial, "as regras normais de experiência nos dão conta de que, a pessoa física que empresta dinheiro ou toma crédito de banco o faz para sua utilização pessoal, como destinatário final, existe aqui a presunção hominis, juris tantum, de que se trata de relação de consumo, quer dizer, de que o dinheiro será destinado ao consumo. O ônus de provar o contrário, ou seja, de que o dinheiro ou crédito tomado pela pessoa física não foi destinado ao uso final do devedor, é do banco..."2; isto é, no caso: como o recorrido é pessoa física e como se trata de uma conta-corrente comum, presume-se que os serviços do Banco eram empregados para o uso final do correntista (mesmo porque o apelado é um engenheiro mecânico, presumivelmente sem outra atividade empresarial). Por outro lado, sendo de consumo o contrato, a vontade do hipossuficiente não tem o efeito de convalidar cláusulas abusivas, como a dos juros, por exemplo. O princípio da pacta sunt servanda, aqui, cede lugar à proteção do consumidor e aos princípios, mais relevantes, da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual. Quer dizer: pouco importa que o consumidor declare a sua vontade, aderindo; o que importa é que o contrato ou as suas cláusulas não sejam abusivas (e tanto é verdade que o artigo 51 do Código do Consumidor estabelece a nulidade das cláusulas abusivas, e quando se fala em cláusulas pressupõe-se a declaração de vontade do consumidor, o que revela a preocupação da lei consumerista com a legitimidade das disposições contratuais, e não com o seu cumprimento puro e simples a despeito da abusividade).2.2. Juros 2.2.1. Taxa A questão da taxa de juros pode ser examinada a partir de diferentes pontos de vista, desde do não-cumprimento do dever de informar até a efetiva abusividade das taxas praticadas mês e a mês pelo Banco, superiores a 8%, salvo em agosto de 1999, conforme demonstrado no laudo (fls. 214 e seguintes).Primeiro, os direitos fundamentais têm eficácia horizontal e, assim, incidem imediatamente nas relações inter-privadas, mesmo sem prévio e específico enunciado normativo; e a despeito da titularidade de direitos fundamentais também pelo co-contratante e embora a autonomia privada represente sem dúvida a exteriorização da pessoa, um direito fundamental, sem se perder de vista que, num sistema capitalista, a própria Constituição prestigia a atividade econômica e protege o lucro, há relações que envolvem bens essenciais à pessoa humana, e nessa medida exigem um maior rigor no seu tratamento legislativo e jurisdicional. Nessas relações, em razão do paradigma da essencialidade, não se aplica o princípio da pacta sunt servanda em todo o seu rigor e nem se deixa de proteger o contratante mais fraco em nome apenas de uma suposta livre manifestação de vontade:"O paradigma da essencialidade constitui-se em um 'método de compreensão do mundo' contratual sob a luz de um novo critério de classificação, de acordo com o qual os contratos finalizados à satisfação de necessidades existenciais devem ser diferenciados daqueles outros contratos cujo objeto seja a utilização o a aquisição de bens não essenciais à pessoa humana enquanto tal. O paradigma da essencialidade significa que o direito contratual considera os bens em vista da sua utilidade existencial para o efeito de classificação dos contratos e, conseqüentemente, para, a respeito das classes assim diferenciadas, prescrever um certo regime jurídico. Os bens são tomados não só nas suas qualidades intrínsecas, mas no modo como satisfazem as necessidades existenciais. Uma vez posta a dignidade da pessoa humana como valor supremo da ordem constitucional, o direito dos contratos a ele necessariamente se curva; as necessidades humanas fundamentais, a pessoa e a sua dignidade passam a ser o critério e a medida dos contornos jurídicos dos bens e dos respectivos contratos.A diferenciação elaborada à luz do paradigma da essencialidade tem enorme relevância na composição dos princípios aplicáveis à relação contratual. Como observado ao longo deste trabalho, o quadro de princípios contratuais tornou-se complexo, observando-se a coexistência, na ordem constitucional em vigor, de princípios potencialmente colidentes entre si. Assim é que, por exemplo, o princípio do equilíbrio econômico -- a autorizar a rescisão lesionaria -- se opõe ao princípio da intangibilidade do pactuado, sendo que a composição entre ambos deverá ser feita em conformidade com dados concretos, constantes da relação contratual in casu".3E os contratos bancários, notadamente os firmados com pessoas físicas, e dentre esses os de conta-corrente, constituem um bem essencial, mais ainda quando se considera o chamado fenômeno da bancarização. Com os recursos da conta, o correntista alimenta a si próprio e a sua família, cuida de suas necessidades básicas e da dos seus (saúde, educação, vestuário etc.); e essa essencialidade autoriza o emprego do instituto da lesão para a limitação dos juros e readequação da economia contratual, bem como o emprego da máxima da experiência que diz que nos dias de hoje dificilmente alguma atividade propicia lucros que permitam o pagamento de juros como os habitualmente impostos pelos Bancos, e um descompasso assim coloca o consumidor numa situação injusta, de desvantagem, de ter de despender mais do que aufere. De fato, os juros altos e às vezes cobrados capitalizadamente sobrecarregam em demasia o mutuário ou o correntista, fazendo com que ele pague muito mais do que tomou emprestado ou que utilizou da sua conta-corrente; e existindo uma situação de normalidade, consistente, pelo exame do que de ordinário acontece, sem se perder de vista a economia brasileira, na presumível inferioridade do consumidor em matéria de juros, na dificuldade deste de arcar com juros exorbitantes, mesmo sem inversão do ônus da prova específica a respeito, ao apelado incumbia o ônus de primeiro alegar e em seguida provar o contrário, ou seja, a capacidade econômica do correntista para suportar juros de mais de 6% (seis por cento) ou 8% (oito por cento) ao mês, pois "La regla, en el sentido que acaba de exponerse, es la de que los hechos normales no son objeto de prueba. El conocimiento de éstos forma parte de esa especie de saber privado del juez, que éste pude invocar en la fundamentación de la sentencia. Lo contrario de lo normal es, eso sí, objeto de prueba. La parte que sostenga que la visubulidad era perfecta durante la noche, o que una casa nueva y biem construída amenaza ruina, o que el acto del comerciante fue a titulo gratuito, o que el presunto padre era impotente, o que el consentimiento fue arrancado por dolo etc. deberá producir la prueba de esse extremo"4. Nesse sentido:"EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. 1. É passível de revisão judicial tanto o contrato de abertura de crédito em conta-corrente quanto o de crédito pessoal, porque ambos ainda vigoram entre as partes. 2. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.. EXAME DA CLÁUSULA CONTRATUAL. ABUSIVIDADE. O exame da cláusula contratual que dispõe sobre juros, considerando o percentual fixado, leva ao entendimento de que ela é abusiva. Embargos Infringentes desacolhidos. (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 70008552747, SEXTO GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: VOLTAIRE DE LIMA MORAES, JULGADO EM 28/05/2004)".Segundo, de todo modo, aliado a tudo isso, especialmente ao dever de informação, há um argumento definitivo e que dispensa o exame da auto-aplicabilidade ou não do revogado parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição Federal: os instrumentos de fls. 110 e seguintes não definem com precisão a taxa de juros. A fl. 111 está dito somente que: "sendo que os valores, prazos, encargos financeiros e moratórios e condições serão definidos a cada operação", e a fl. 115: "O Banco reserva-se o direito de modificar os encargos financeiros divulgados para cada período, sempre que as condições de mercado o exigirem, ou os normativos do Banco Central ou as autoridades governamentais alterarem as normas vigentes que nortearam a presente contratação, mediante prévia comunicação, com antecedência de cinco dias", enquanto que a fl. 117: "Sobre as importâncias utilizadas pelo Creditado, por conta do crédito aberto, incidirão Encargos Financeiros, ou seja, juros e correção monetária... ou juros prefixados mais correção monetária pós-fixada, por índice de variação do indexador utilizado oficialmente, reconhecido e de conhecimento público. Os Encargos Financeiros incidentes em cada operação, serão informados pelo Sistema Telebanco, Caixas Automáticvos e/ou Sistema Home Bank, por ocasião de cada transação, bem como estarão disponíveis nas Agências HSBC Bamerindus, inclusive nos casos de solicitações de crédito através de formulário anexados ao talonário de cheques" . Essas disposições contratuais, no entanto, todas elas, contrariam o disposto no artigo 52 do Código do Consumidor. Elas estabelecem a possibilidade da variação da taxa de juros sem fixar, contudo, critérios objetivos para o seu cálculo; nelas consta, somente, que a taxa de juros será a praticada pelo recorrente, sem estabelecer nada mais, sem dizer quais os elementos para a determinação da taxa, que poderá ser qualquer uma e, o que é pior, fixada unilateralmente pelo próprio credor, em uma cláusula puramente potestativa, sem o menor controle pelo correntista ou pelo juiz. Trata-se do direito à informação, expressamente mencionado no artigo 6º, III, do Código, e que tem fundamento constitucional, além de o artigo 51, X, da Lei 8.078 vedar expressamente a variação unilateral do preço pelo fornecedor (e os juros são o preço do dinheiro, a remuneração do mútuo). Tem o consumidor, enfim, o "direito irrefragável de ser informado detalhadamente sobre todos os termos do contrato de mútuo ou de financiamento... Dentro desse parâmetro normativo, emerge irrecusável a ilação de que não pode ser consentida a cobrança de juros flutuantes estipulados em cláusula contratual que agride veementemente a legislação em vigor..."5E o que o Código do Consumidor quer é que a informação seja prévia, conste do instrumento contratual, a fim de que o consumidor possa ou não optar livremente pela contratação, pela adesão ao contrato. A informação posterior à contratação, após a concessão do empréstimo, não atende à finalidade da norma, que é proteger o correntista ou o mutuário. Por outro lado, nada nos autos demonstra que, no momento da contratação por terminais eletrônicos, o cliente é avisado da taxa de juros que lhe será cobrada (e mesmo aí, pelos termos da contestação e das razões de recurso, persistiria o inconveniente da variação da taxa de juros, da sua flutuação mensal):"Sendo os juros o 'preço' pago pelo consumidor, nula cláusula que preveja alteração unilateral do percentual prévia e expressamente ajustados pelos figurantes do negócio".6Desse modo, principalmente por esse último fundamento, os juros praticados pelo Banco não podem prevalecer, restando determinar a que taxa eles são devidos.As cláusulas antes referidas são mesmo nulas. Mas uma coisa é certa: as partes não quiseram contratar a taxa legal de juros; o Banco não quis impor apenas 6% (seis por cento) ao ano, mas outra, embora indevida; e o recorrido aderiu ciente que a taxa não seria de 6% (seis por cento) ao ano, mas outro, embora não a praticada pelo recorrente. Isso e mais a possibilidade da conversão do negócios nulos, ou mesmo das cláusulas nulas, a partir da vontade presumida dos contratantes7, permite esta conclusão, mais ainda quando se considera a própria Constituição Federal estabeleceu uma taxa diferenciada aos negócios bancários (art. 192): a taxa de juros deve ser de 12% (doze por cento) ao ano.2.2.2. AnatocismoDe acordo com o perito, houve capitalização de juros em razão da incidência de novos juros sobre um saldo devedor já composto de outros juros (fl. 207), afirmação confirmada posteriormente, as fls. 272 e seguintes. A idéia de que o contrato de conta-corrente comporta, a cada período de saldo negativo na conta, um novo empréstimo pelo Banco, conforme insinuado pelo assistente do recorrente a fl. 247, improcede. Mesmo que isso ocorra, incidência de juros sobre juros persistiria e, com ela, o aumento do valor da dívida do correntista. O valor mutuado serviria, enfim, nessa linha de raciocínio, para cobrir o principal e os juros sobre juros, e o aumento mês a mês do débito e a obrigação de pagamento da dívida ao término do contrato faz com que o cliente pague uma dívida maior que pagaria se os juros incidissem somente sobre o principal e não sobre este acrescido dos juros incidentes no mês anterior.E a capitalização de juros é expressamente vedada, sem que se possa enxergar na Lei de Usura, que fala na possibilidade da capitalização anual de juros na conta corrente, autorização para o anatocismo em contratos como os dos autos. A conta corrente de que trata aquela lei não é o contrato bancário de conta corrente, mas o contrato em que "duas pessoas convencionam reunir em massas homogêneas alguns ou todos os seus negócios, mediante recíprocas remessas, que, anotadas na conta, se tornam partidas ou artigos de crédito...", não se confundindo com "o contrato de conta corrente com a conta 'deve' e 'haver', especialmente usada entre banqueiro e cliente..."8. "Entre nós, forte é a voz magistral de Pontes de Miranda a ensinar que não se confunde a conta-corrente bancária com o contrato de conta-corrente porque neste, o pressuposto essencial é a reciprocidade inexistente naquela".9Por fim, a Lei de Usura é clara: veda-se a capitalização de juros, e posterior ao Código Civil anterior, querendo isso significar que houve a revogação do direito anterior.E não há autorização para o anatocismo dada por medida provisória.A capitalização de juros é, em primeiro lugar, moralmente criticável10. Ela permite o lucro fácil, a duplicação anual da dívida, com flagrante prejuízo ao devedor. Ao menos para os contratos paritários, ou seja, para aqueles em que existe um aparente equilíbrio de forças e o devedor, assim, contrata sabendo e aceitando os encargos, seria possível admiti-la, ou admitir uma lei, como o novo Código Civil, que a estabelecesse. Mas e para os contratos de consumo, é possível dizer que uma medida provisória ou uma lei que não seja especificamente de consumo possa estabelecer a prática do anatocismo? Uma lei assim editada seria constitucional?A proteção do consumidor tem um fundamento constitucional. A Constituição Federal, primeiro, coloca o direito do consumidor como garantia fundamental (art. 5º, XXXII), e, também, e mesmo como conseqüência, como um princípio regulador da ordem econômica e financeira (art. 170, VI). O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, como norma que desenvolve esse imperativo constitucional, tem características específicas, que lhe conferem "uma nova superioridade hierárquica"11. Mais ainda: "o CDC é lei especial na sua face subjetiva, pois só impõe regras para as relações contratuais e extracontratuais envolvendo pessoas, que define como consumidores e fornecedores. De outro lado, é lei geral, em grande parte de sua face material, pois trata de várias relações jurídicas envolvendo consumidores e fornecedores, não tratando exaustivamente ou especificamente de nenhuma espécie de contrato em especial, mas impondo novos patamares gerais de equilíbrio e de boa-fé a todas as relações de consumo"12. A partir desses argumentos:a) somente uma lei especial, que também trate de relações de consumo, pode revogar algum dispositivo do Código do Consumidor ou restringir algum dos princípios nele consgrados;b) mas mesmo que essa lei seja especial, ela, para ser válida, constitucional, deve atender a um segundo requisito: para que ocorra a revogação da norma anterior ou a restrição a um dado princípio, ela deve também proteger o consumidor, sob pena de ser inconstitucional, materialmente inconstitucional. Por exemplo, uma norma não pode, ainda que se destine a regular uma determinada relação de consumo, restringir algum direito do consumidor, negar-lhe proteção, colocá-lo, enfim, em uma situação desfavorável. Aí, a nova lei estaria contrariando um preceito constitucional. E um exemplo de criação de situação desfavorável é exatamente essa da capitalização. Como visto, o anatocismo privilegia apenas um dos contratantes, e no caso dos Bancos, o contratante mais forte. Nessa medida, ao onerar demasiadamente o consumidor, ela contaria a Constituição, em dois pontos: ao reduzir a nada a proteção do consumidor e ao exonerar o Sistema Financeiro do dever social que a própria Carta reservou-lhe -- de concorrer para o desenvolvimento do País (e é extremamente difícil conceber que algum país possa desenvolver-se com juros altíssimos e cobrados capitalizadamente; uma situação assim revela a preocupação, neoliberal, com o capital, e apenas com ele).Portanto, se não fosse um outro vício, a referida medida provisória seria inconstitucional por esse motivo.Demais, e agora o vício formal: a matéria foi tratada em medida provisória. Esta só pode ser expedida quando"(a) situação muito grave demande providências imediatas, que tenham de ser tomadas incontinenti, pena de perecimento do interesse público que devem suprir, e (b) a natureza da medida seja compatível com a fragilidade inerente ao seu conteúdo efêmero e precário"13. Como medidas excepcionais, elas somente podem ser editadas nos estritos casos do artigo 62 da Constituição Federal, principalmente quando houver urgência, isto é, uma situação grave que, se não for prontamente atendida, pelo decurso do tempo, implicará no perecimento do interesse público subjacente. Seriamente falando, qual a urgência na adoção de uma medida provisória regulando contratos bancários e a capitalização? Será que, sem a capitalização, o País simplesmente ruiria? Qual o benefício que, se não atendido a tempo, prejudicaria um interesse público? Parece difícil identificá-lo. A edição de uma medida provisória desse teor, e o que é pior, reeditada dezenove vezes, prática também inconstitucional14, traduz a fragilidade do Governo e a avidez em tratar bem, mesmo que em detrimento de todos os demais, os banqueiros, os detentores do capital e, por que não dizer, os verdadeiros detentores do Poder.Sendo assim, e como o Poder Judiciário tem o dever, ditado pela Constituição e pelo interesse público, não do Governo ou do capital, de reconhecer a inconstitucionalidade, a aludida medida provisória é de todo irrelevante para a decisão da causa.O recurso ao novo Código Civil esbarra em dois argumentos. Primeiro, e o mais evidente, no princípio da irretroatividade. O contrato é anterior à nova lei. Segundo, o Código Civil é o código dos iguais, que regula relações entre duas pessoas em pé de igualdade, que podem contratar amplamente, discutindo as cláusulas e termos contratuais; enquanto que o Código do Consumidor é o código dos desiguais, e ele trata desigualmente para igualar, na medida suficiente para que recolocar os contratantes em igualdade. E sendo outra a situação substancial determinada pela qualidade dos sujeitos da relação jurídica, o novo Código Civil não revogou o Código do Consumidor. Um e outro continuam em vigor, regulando o primeiro as relações civis, entre iguais, e o segundo, as relações de consumo. Há um diálogo entre as fontes, podendo aquele regular as relações consumidor-fornecedor subsidiariamente, "seja como base conceitual, seja como norma complementar, no que couber e não contrariar o espírito protetor da lei tutelar, seka como norma mais favorável ao consumidor naquele caso".15 2.3. Restituição dos valores pagos a maiorOs valores pagos a maior em razão da capitalização de juros e do emprego de uma taxa de juros indevida devem ser restituídos, nos termos do artigo 42 do Código do Consumidor sem que se deva falar em erro do solvens. É que há uma clara diferença entre a repetição do que foi indevidamente pago e restituição daquilo que o credor recebeu por força de uma obrigação nula ou anulável. Sendo nula ou anulável o contrato ou a cláusula contratual, a sentença que decretar a nulidade ou a anulabilidade terá o efeito de recolocar as partes no estado anterior ao negócio, de reverter ao patrimônio de uma e de outra aquilo que foi reciprocamente ou unilateralmente prestado (art. 158 do Código Civil revogado)16. O artigo 964 do antigo Código Civil, assim, contemplava outras hipóteses que não as de restituição do que foi pago em razão de obrigação nula ou anulável; contemplava hipóteses como a do pagamento de obrigação anteriormente extinta, ou de pagamento efetuado quando pendente condição suspensiva, ou quando realizado a falso credor ou "quando, embora válida, o solvens não era o verdadeiro devedor, embora o accipiens fosse o verdadeiro credor"17. Pensar de outro modo e dizer que, mesmo na obrigação nula, o artigo 964 do Código Civil incide, exigindo-se do solvens também a prova do erro, importaria: (a) primeiro, na contradição entre dois dispositivos do mesmo código, e essa contradição poderia ser sanada pela aplicação da regra específica do artigo 158 do antigo Código Civil (e a capitalização de juros representa uma cláusula nula, efetuado devedor, por força dela, o pagamento de valores superiores ao devido); (b) exigir-se o erro para a restituição nos casos de nulidade ou de anulabilidade implicaria em um requisito a mais ao lado daqueles enumerados pelo Código Civil; ou seja, além, por exemplo, da abusividade da cláusula, o erro, com o risco de uma situação como esta, absurda: embora reconhecida a nulidade, mas não provado o erro do devedor, mesmo dizendo a norma que a obrigação é inválida e que nenhum efeito pode produzir o ato jurídico nulo, o pagamento continuaria nas mãos do credor, ou seja, o contrato produziria um único efeito, mantido a despeito da nulidade.Desse modo, também neste ponto a r. sentença deve ser mantida.2.4. Multa moratóriaO autor não pediu a redução da multa contratual, questão que o MM. Juiz certamente conheceu de ofício, pronunciando a nulidade da cláusula do contrato de fl. 115, e sendo de consumo a relação, pode o juiz atuar ex officio, conforme a doutrina:"A jurisprudência brasileira, em especial o STJ, já pacificou a questão, pois considerou que é possível ao Judiciário atuar ex officio na proteção do consumidor para controle (em concreto) das cláusulas abusivas em contratos de consumo. Sendo a nulidade absoluta, tal fato tem fortes reflexos no processo civil, mas não significa a falta de valoração por parte do Judiciário, que ao contrário só considerará nula a cláusula que puder ser submetida na norma do CDC e interpretada no contexto do contrato como tal".18E o Código do Consumidor, no seu artigo 52, limita a multa contratual a 2% (dois por cento).2.5. Cláusula 9.0Como visto, a cláusula é nula, tal como consta do item 2.2.1.2.6. Cadastramento. Dano moralTambém como visto, houve a cobrança de juros indevidos e capitalizados e nessa medida:a) conforme constatado pelo perito, afastada a capitalização e reduzidos os juros para 12% (doze por cento) ao ano, não havia quando do cadastramento saldo devedor, mas saldo credor (fl. 208);b) o cadastramento pressupõe a existência de uma dívida líquida e certa e a mora do devedor (art. 42, CDC); sem um desses requisitos, o cadastramento será indevido, e sendo indevido o cadastramento, a inscrição no SERASA, SPC etc. importa dano moral:"A inscrição indevida do nome do autor em cadastro negativo de crédito, a par de dispensar a prova objetiva do dano, que se presume, é geradora de responsabilidade civil para a instituição bancária, desinfluente a circunstância de que a abertura de conta se deu com base em documentos furtados e para tanto utilizados por terceiro" (STJ, Resp. 432.177/SC, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior).2.7. Indenização O MM. Juiz fixou a indenização em 30 (trinta) salários mínimos.Decorrendo o dano moral da lesão a interesses não-patrimoniais, apenas a extensão e a gravidade da ofensa deveriam servir como critérios para a sua compensação, sem se pensar em uma função punitiva ou preventiva19, aliás, como estabelece o artigo 944, parágrafo único, do novo Código Civil. Entretanto, o uso das duas funções, ressarcitória e punitiva, ao lado do efeito dissuasivo, é aceito na doutrina, majoritariamente, e nos tribunais quase que unanimemente, e afina-se a um senso ético-moral mínimo que quer que o ilícito seja de algum modo punido. "O professor Carlos Alberto Bittar encontrou o ponto de equilíbrio ao fazer a simbiose entre o caráter punitivo do ressarcimento do dano moral e o caráter ressarcitório. A conjunção de ambos os critérios é apontado em diversos julgados dos Tribunais do País. A gravidade da lesão, a magnitude do dano e as circunstâncias do caso, além do efeito dissuasório da indenização devem ser observados, de forma conjugada e com bastante rigor na fixação do montante indenizatório"20. E reconhecida a necessidade da indenização cumprir aqueles papéis, os critérios mais adequados e corretos para a sua fixação devem ser: (i) os inerentes à lesão em si, ou seja, aqueles que retratam a extensão desta (como a essencialidade do bem atingido, o sofrimento causado à vítima quando isso ocorrer); os relacionados ao comportamento do ofensor, ao lado de dados econômico-financeiros e sociais, muito embora esses dados não devam relacionar-se à vítima, por não se coadunarem "com a noção de dignidade, extrapatrimonial, na sua essência, quaisquer fatores patrimoniais para o juízo de reparação"21. O efeito dissuasório deve ser empregado quando a atividade danosa do ofensor puder repetir-se, quando a situação de fato indicar a necessidade de refrear-se possíveis condutas semelhantes e igualmente ilícitas.No caso dos autos:a) ao que tudo indica o autor não esteve cadastrado em outras oportunidades;b) o cadastramento repercutiu em outros negócios do recorrido, conforme consta as fls. 45 e 46;c) o réu possui excelente capacidade econômico-financeira;d) se se pudesse falar em culpa, a dos prepostos do Banco seria gravíssima. Mesmo sem poder capitalizar juros, o recorrente procedeu dessa forma, bem como agiu ilicitamente ao impor cláusulas absolutamente nulas. Ainda, a indenização deve ser suficiente para atuar no ânimo do ofensor e evitar que ele atue em outras oportunidades da mesma forma, ilicitamente.Diante disso tudo, o quantum indenizatório foi razoavelmente fixado.2.8. Juros e correção monetáriaAo contrário do que sustenta o recorrente, os juros de mora são devidos no mínimo desde a citação inicial (embora a fixação do termo inicial em outro momento anterior não fosse incorreto, já que se trata de uma relação de consumo, e em relações de consumo o consumidor não pode sofrer prejuízos, ou seja, o dano deve ser integralmente ressarcido, art. 6.º, VI, CDC), conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça:"RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. ACIDENTE COM PASSAGEIRO DE COLETIVO. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. JUROS MORATÓRIOS. CITAÇÃO. PRESCRIÇÃO. VINTENÁRIA. CÓDIGO CIVIL. ART. 177.- Em caso de responsabilidade civil contratual, os juros moratórios são contados a partir da citação.- O prazo prescricional é vintenário, eis que não foi o exercício da atividade de transportadora que causou o acidente, mas ato culposo de seu preposto.- Em se tratando de contrato de transporte, os juros incidem a partir da citação. Não incide a Súmula 54" (RESP 540330/SP; RECURSO ESPECIAL 2003/0060329-4).Quanto à correção monetária, no entanto, assiste razão ao Banco. Pelo que consta a fl. 295, o MM. Juiz determinou a atualização do valor da indenização do dano moral a partir da citação inicial. Entretanto, como os valores foram fixados em salários mínimos e na sentença, o correto será que a correção monetária incida a partir da decisão de primeiro grau, porquanto a fixação do valor em salários mínimos assegura a atualização monetária da indenização.§ 3.PELO EXPOSTO, a Câmara, por unanimidade, provê a apelação em parte para: (a) elevar a taxa de juros para 12% (doze por cento) ao ano e (b) que a correção monetária da indenização do dano moral flua da data da r. sentença, sem alteração dos ônus da sucumbência.Participaram do julgamento os Senhores Juízes José Augusto Gomes Aniceto e Wilde de Lima Pugliese, que acompanharam o voto do Relator.
Curitiba, 09 de novembro de 2004
Albino Jacomel GuériosJuiz Relator Convocado1 RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Direito Material, São Paulo: Saraiva, p. 87, 200.
2 NERY JÚNIOR, Nelson, ibidem.
3 NEGREIROS, Teresa, Teoria do contrato. Novos paradigmas, Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2002, p. 475.
4 COUTURE, Eduardo J., Fundamentos del Decrecho Procesal Civil, 3ª ed., Buenos Aires, Ediciones Depalma, 1988, p. 232.
5 OLIVEIRA, James Eduardo, Código de Defesa do Consumidor anotado e comentado, São Paulo: Atlas, 2004, p. 323.
6 MARQUES, Cláudia Lima, apud OIVEIRA, James Eduardo, ob. c., p. 305.
7 BITTAR, Carlos Alberto, Curso de direito civil, v. 1, 1.ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1994, p. 171.
8 CARVALHO DE MENDONÇA, José Xavier, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, v. VI, parte II, 4ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, pp. 352, 353 e 355.
9 DORNELLES DA LUZ, Aramy, Negócios Jurídicos Bancários, O banco múltiplo e seus contratos, São Paulo: RT, 1996, p. 52.
10 NETTO LÔBO, Paulo Luiz, Direito das Obrigações, Jurídica Brasileira, 1999, p. 95.
11 MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4ª ed., São Paulo: RT, 2002, p. 526.
12 MARQUES, Cláudia Lima, ob. c., p. 533.
13 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, Curso de Direito Administrativo, 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 99.
14 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, ob. c., p. 99.
15 MARQUES, Cláudia Lima, Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil: o "diálogo das fontes", in Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, obra conjunta, MARQUES, Cláudia Lima, BENJAMIN, Antônio Herman V. e MIRAGEM, Bruno, São Paulo: RT, 2003, p. 51.
16 Cf. MIRANDA, Pontes, Tratado de Direito Privado, t. IV, 4ª ed., São Paulo: RT, 1984, p. 252, 17 SANTOS, J. M. de Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, v. XII, 12ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1984, p. 393.
18 MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4ª ed., São Paulo: RT, 2002, p. 778.
19 MORAES, Maria Celina Bodin de, Danos à Pessoa Humana, Uma Leitura Civil Constitucional dos Danos Morais, Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 303 e seguintes.
20 SANTOS, Antonio Jeová, ob. c., p. 162.21 MORAES, Maria Celina Bodin de, ob. c., p. 306.

TAXA DE JUROS NO S.F.H.

Extraído do site apriori (www.apriori.com.br/durigan)
Paulo Luiz Durigan *
Para fazer frente à necessidade de recursos para os financiamentos da casa própria, criou-se em 13/09/1966, através da Lei 5107, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, tendo sido designado o BNH como gestor. Logo em seguida, em 21 de novembro de 1966, com os mesmos objetivos, nasceram, através do Decreto no. 70, as Associações de Poupança e Empréstimo. Com verba cativa e não mais dependente da poupança voluntária, já em 1967, primeiro ano de arrecadação do FGTS, o volume de recursos à disposição do BNH cresceria 483%, mesmo ano em que iniciou-se o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos - SBPE, agrupando empresas públicas e privadas. Todavia, o aumento considerável dos recursos também trouxe preocupação quanto ao seu retorno, de forma a equilibrar-se o sistema aos juros pagos pelas aplicações no FGTS e nas poupanças populares. Para se evitar o custo político e a redução dos empréstimos às camadas de baixa renda, optou-se por estabelecer uma escala de juros conforme o valor do financiamento, o que, na maioria dos casos, representava o próprio valor dos imóveis adquiridos. A RD BNH 55/1968, que vigorou de 27.11.1968 a 22.10.1969, por exemplo, fixou as seguintes faixas de financiamento, prazos e respectivas taxas de juros: FINANC. EM UPC - TAXA MÁXIMA - PRAZO EM ANOS Até 100 ....................... 4,0 ............. 20 Acima de 100 até 160 .. 5,0 ............. 20 Acima de 160 até 220 .. 6,0 ............. 20 Acima de 220 até 300 .. 7,0 .............. 20 Acima de 300 até 350 .. 8,0............... 20 Acima de 350 até 500 .. 10,0 ............. 20 De lá para cá alterou-se muito esse quadro, inclusive com mudança quanto ao prazo máximo de financiamento, e, em determinado momento, sendo as taxas atreladas à renda do mutuário. No SFH, com respeito à taxa de juros, frequentemente discute-se se: a) ao aplicar o índice de correção dos saldos, o agente também adota a taxa de juros da poupança (0,5% mês)? b) a taxa de juros pode ir além dos 10% ao ano? c) a taxa fixada é a taxa nominal anual ou a efetiva anual; e d) se com a utilização da Tabela Price há capitalização dos juros? Juros da poupança Quanto à primeira questão, que se vê comumente alegada, trata-se de equívoco, pois que a instituição financeira, ao aplicar o índice de correção aos saldos devedores, evidente o faz SEM a aplicação do acréscimo decorrente aos juros da poupança, limitando-se apenas ao indexador. Limite Quanto ao limite da taxa de juros, o art. 6o., "e", da Lei 4.380/64 ("os juros convencionais não excedam de 10% ao ano") e art. 2º. do Decreto 63.182/68 limitam os juros, dentro do Sistema Financeiro Habitacional ao máximo à 10% (dez por cento) anuais. A controvérsia, entretanto, é quanto às leis posteriores e até mesmo regulamentos que alteraram essa taxa de juros. Embora possa se utilizar aqui os mesmos argumentos para a exclusão da Taxa Referencial, isto é, que a Lei 4380/64 fixou os parâmetros principais do Sistema e não foi revogada, estabelecendo, portanto a taxa máxima de 10% (dez por cento), a maior parte dos julgados inclina-se à limitação constitucional de 12%(doze por cento), pois que os órgãos governamentais teriam competência para modificá-la, adequando-a às exigências da economia. Mas não é pacífico, igualmente, a manutenção do limite constitucional, ainda que, ao que parece, resida com aqueles que fixam os juros em 12% os melhores argumentos. Ocorre que a Lei 4595/94 (Lei da Reforma Bancária) não foi recepcionada pelo novo ordenamento constitucional de 1988, ocorrendo em relação a ela o fenômeno da revogação. E, deixando de ter vigência esta lei, a matéria referente aos juros passaram a ser submetidas ao que dispõe o Código Civil e a Lei da Usura. Até mesmo a Súmula 596 do STF, que excepcionava as instituições financeiras do campo de aplicação dessa última lei, perdeu a aplicabilidade, já que foi produzida sob a égide da Lei 4595/64, então revogada. De qualquer forma, mesmo aceitando (para argumentar) a vigência da Lei 4595/94, concluiremos, frente ao que dispõe em seu art. 4, IX, que a limitação das taxas de juros somente poderia ser fixada dentro do que pressupõe a legislação ordinária (Art. 1062 CC), isto é, entre 6% e 12% ao ano, e nunca maior. Vamos além: o parágrafo 3o. do art. 192 da Constituição Federal, que limitou a taxa de juros em 12% ao ano é auto-aplicável, por conter no próprio texto constitucional todos os comandos necessários para sua imediata aplicação, inclusive conceituando o que considera juros reais. Ressalte-se, inclusive, que as normas definidoras de direitos e garantias individuais, independente de sua localização topográfica, tem imediata aplicação (art. 5, 1, CF). Ainda que se diga que o dispositivo acima transcrito depende de auto-regulamentação, tal disciplina jurídica, em nenhuma hipótese poderá dispor de forma que os juros sejam superiores a 12% ao ano – o que torna inócua a alegação. Há de reconhecer que há divergência no âmbito do Supremo Tribunal Federal a respeito da auto-aplicabilidade do §3o. do art. 192 da Carta Magna, por entender que a expressão "nos termos que a lei determinar" remete para a legislação infraconstitucional a definição do que sejam juros reais. Porém, além de tudo o que aqui foi dito, veja-se que a mencionada lei reguladora está prevista no caput do artigo e atinge somente as questões elencadas nos incisos (I a VII). O parágrafo 3o. trata de questão totalmente desvinculada do caput e seus parágrafos. Nestes a Lei Maior contém disciplina do Sistema Financeiro Nacional, determinando que a lei infraconstitucional deverá dispor sobre sua estrutura e funcionamento, enumerando os casos que necessitam de regulamentação. Os juros, portanto, estão disciplinados em parágrafo que tem conteúdo de autonomia. Se o constituinte quisesse submetê-los à lei complementar, tê-lo-ia inserido num dos incisos. Taxa legal No que tange à questão se a taxa legalmente exigível é a efetiva anual ou a nominal anual, entendo ser esta última. O que se constata, na prática, é o seguinte artifício: tomando por exemplo a taxa nominal de 10% a.a., o agente financeiro simplesmente a divide por 12, encontrando a taxa proporcional mensal de 0,833333% que, capitalizada mensalmente, acumula ao final de doze meses o percentual de 10,47%, portanto superior à taxa contratada. Parece-me que o correto seria a determinação da taxa equivalente mensal de 0,797414% que, capitalizada mês a mês, acumula no ano exatamente 10%, espelhando, assim, aquela fixada para o financiamento. Aliás, entendendo-se que o limite da taxa de juros é de 10% anuais, tal taxa mensal não poderia ser superior a 0,797414%; e, a se entender o limite como de 12% ao ano, não poderia ser superior a 0,948879% mês. Por vezes os agentes defendem-se alegando que a taxa efetivamente cobrada é a nominal e não a efetiva. Para essa demonstração, dividem a taxa anual por 12 (12 meses) e a multiplicam pelo valor do saldo devedor no mês, para indicar que os juros cobrados foram aqueles referentes à taxa nominal e não à efetiva. Dizem, também, que não há vedação legal a informar qual a taxa de juros efetiva resultante, embora se cobre sempre a nominal. O raciocínio, embora a primeira vista pareça ser simples e definitivo, não é correto: é que em vista das características do empréstimo e o cálculo da Tabela Price, resulta inequivocamente em taxa efetiva anual maior. Anatocismo Continuando, a resposta, enfim, tem a ver com capitalização ou não de juros - e disto vamos à última questão. Ocorre que os empréstimos bancários podem ser, a princípio, na forma de cobrança de juros antecipados, mensais ou ao final do prazo. A taxa de juros deve ser adaptada a cada caso, sob pena de incidir-se em capitalização. Por exemplo, se em financiamento com taxa contratada de 12% ao ano, os juros são exigidos antecipadamente, sua taxa efetiva é muito maior daquela que haveria caso o pagamento fosse mensal; e esta, por sua vez, seria maior se a quitação ocorresse ao final do prazo. No caso do Sistema Financeiro da Habitação ou Hipotecário, a cobrança de juros é mensal, com base no saldo devedor previamente corrigido e excluídas eventuais amortizações anteriores, o que se faz graças à opção pelo Sistema Francês de Amortização. Tal "sistema" fornece nada mais que o valor de uma constante [prestação], a qual liquidaria o financiamento ao final do prazo, com a cobrança mensal de juros. Como se disse, a princípio poderia pensar-se que não há capitalização, posto que os juros são calculados através da obtenção da taxa nominal mensal, a partir da taxa nominal anual indicada em contrato. Porém, algumas perícias revelam que o caso é que toda vez que se faz o pagamento de um encargo mensal estará se ADIANTANDO OS JUROS, já que o prazo do financiamento é de vários anos. Assim, para podermos detectar qual a taxa efetiva de juros paga, haveremos de obter essa taxa final a partir da taxa mensal nominal. Em um caso em que a taxa de juros anual, por exemplo, é de 15%, isso implica na taxa efetiva anual de 16,075451%, conforme é mesmo declarado nos contratos. Aí já se vê que, efetivamente, há capitalização de juros, os quais se transformam de 15,00% em 16,075451% ano (aliás, basta verificar a fórmula de cálculo do coeficiente para detectar-se a exponenciação). Em um prazo de 60 meses tais juros chegam a 110,7181% (capitalização composta), contra os 75% (capitalização linear) (15 vezes 5 anos), caso fossem pagos somente ao final. Pode-se alegar que contratou-se pagamento mensal de juros, mas isto não implica em dizer que não está havendo capitalização e um acréscimo (aqui na ordem de 35,7181%), com o que foi contratado, no caso, taxa de juros de 75% (isto é, 15% por cinco anos). E isto simplesmente porque para evitar tal cobrança bastaria o Agente utilizar-se, caso, da taxa de juros anual nominal de 11,245% para igualar-se à taxa efetiva de 75% ao final dos 60 meses do contrato, isto é, {[(11,245/1200)+1)^60] = 1,7500}. Além desse fator, se for considerado, como se disse em outro artigo, que ao se aplicar a TR, utilizou-se o agente de dois fatores de remuneração, a aplicação simultânea de taxa de juros implicará novamente em capitalização, fazendo com que taxa vá além da devida. Aliás, não fosse esta a situação de fato, razão alguma haveria para indicar a taxa efetiva nos contratos da casa própria. Confira-se a resposta do Perito Édison Luiz Kruger nos autos 99.0022417-5 da 4a. Vara da Justiça Federal de Curitiba:
Citação:
"Primeiramente, deve ser feita distinção entre o valor dos juros e taxa de juros aplicada. Nos dois contratos pertinentes à presente demanda, o valor dos juros não se incorporou (capitalizou) ao saldo devedor com ulteriores incidências. A cada vencimento, o valor dos juros foi satisfeito, isoladamente ou juntamente com a parcela de amortização. Todavia, a taxa de juros, face ao custo do dinheiro no tempo, tem efeito exponencial, capitalizado. "Em alguns casos, o Agente se utiliza de taxa de juros de 10% ao ano e o restante a título de "Comissão de concessão de crédito". Mas isto não chega a modificar em nada a situação, posto que o cálculo efetivo dos juros sempre se faz pela somatória das duas taxas, voltando-se à situação anteriormente descrita. E a capitalização de juros, como é ressabido, é vedada (art. 4º do Decreto 22.626/33 e Súmula 121 do STF). Dentro desse mar de desconformidade que tem sido os resultados das perícias, somos tentados a acreditar que, na realidade, em face da sistemática de pagamentos (mensal), o que remunera o agente não é a taxa anual nominal, mas sim a anual efetiva. Porém, o fato de constar expressamente do contrato a informação da existência dessa taxa anual efetiva não dá direito à instituição financeira de exigi-la, pois que resultaria em admitir como legal a capitalização dos juros acordados. A sistemática de revisão do contrato, com vias a evitar a aplicação da taxa anual efetiva indicada no contrato, está na cobrança de taxa mensal "x" que resulte em que a taxa anual nominal indicada no contrato seja a efetiva (por exemplo, em caso de taxa de juros anual nominal de 10%, aplicar a taxa mensal de 0,797414% ao invés de 0,83333%). Esta não é a única solução. Outra tem sido dada pela Vara Federal Especializada do Sistema Financeiro da Habitação de Curitiba, adotando o chamado "Método de Gauss". É um procedimento interessante, vantajoso para o mutuário, mas que cria algumas dificuldades na própria formatação e justificação da sentença, situações estas que veremos em outro texto.
* Paulo Luiz Durigan Advogado em Curitiba/PR Currículo: http://www.apriori.com.br/durigan/

terça-feira, março 07, 2006

Autuação do INSS nas prefeituras

Atualmente, virou moda autuar as prefeituras sem o devido processo legal.O INSS é campeão nesta modalidade.O Auditor Fiscal inicia um processo de análise de todos os registros contábeis, como folha de pagamento, livros Diário e Razão, comprovantes de recolhimento (GR, GPS, GFIP - dependendo da data de consolidação da pretensa dívida), etc.Após, emite o TIAF (Termo Inicial de Auditoria Fiscal) e TEAF (Termo de Encerramento de Auditoria Fiscal). Após, emit a NFLD (Notificação Fiscal de lançamento de Débito) e tenta convencer (e geralmente convence) o prefeito a assinar o LDC (Lançamento de Débito Confessado). Resumidamente (pulando algumas etapas da auditoria fiscal), é isso que ocorre. O INSS consolida unilateralmente uma dívida, que muitas vez é impagável.Considerando dezenas de formas de anular técnico-contabilmente a dívida, além das possibilidades jurídicas, pode-se analisar sintética e brevemente algumas condições de nulidade do débito fiscal:a) - a Prefeitura autuada possui concurso público homologado? Se positiva a resposta, os servidores públicos efetivos (Art. 40 da CF) participam de Regime Próprio da Previdência? Se positiva, então não há obrigatoriedade de recolhimento ao INSS;b) - a prefeitura contrata periodicamente profissionais autônomos para consultoria contábil ou jurídica? Se estes profissionais forem equiparados a empresas ou pessoas físicas, então não há retenção dos 11%, conforme previsão da IN INSS/DC Nº 100/2003 e IN MPS/SRP Nº 3/2005, Art. 176, IV;c) - toda a documentação contábil realmente foi auditada pelos auditores: folha de pagamento, livro diário/razão, guias de recolhimentos...Estes são apenas alguns exemplos de as prefeituras não pagarem o que não devem.Outras questões abrangem as fundações criadas pelos municípios que, se seguirem as cominações legais e constitucionais, são entes imunes, inclusive no que tangem ao recolhimento da cota patronal do INSS.O mais importante é considerar que quando há pretenso débito consolidado unilateralmente pelo INSS, há também a retenção deste valor no FPM, mensalmente, corroendo a já minguada receita das prefeituras.O gestor público, imbuído dos princípios motores da gestão fiscal responsável, não ficará adormecido frente a esta problemática que dilapida com o patrimônio dos contribuintes municipais.O remédio é homeopático: buscar a nulidade da dívida através de uma outra auditoria ou perícia fiscal e contábil, para fundamentar possível ação declaratória de nulidade de débito fiscal.A jurisprudência dominante do STJ e STF considera que a declaratória é imprescritível, ou seja, poderá ser interposta a qualquer tempo sempre que houve vícios insanáveis no processo a ser anulado.Ademais, o título só se torna líquido, certo e exigível após a formação do contraditório, concedendo ampla defesa ao réu, primando pelo due process of law.Portanto, não é justo, moral nem razoável aceitar o pagamento de dívidas em que a certeza de sua consolidação é temerária, por agredir os princípios egrégios da moralidade, razoabilidade, proporcionalidade (menor onerosidade), contraditório e ampla defesa.

Ronildo da C Manoel
Contabilista
CRC/PR 050.461/P-1
Autor do livro Perito-contador pela Editora Juruá

sexta-feira, março 03, 2006

Desboqueio do INSS retido nas cotas do FPM

O Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), a pretexto da consolidação de dívida fiscal e sua confissão através de Lançamento de Débito Confessado, ou albergando-se no Art. 160, parágrafo Único, da CF, vem autorizando a retenção de parcelas do INSS, quando de inadimplência dos municípios. Acontece que quaisquer débitos ou créditos só podem ser considerados líquidos, certos e exigíveis quando, após instauração do devido processo legal e contraditório, houver sentença transitada em julgado, fundamentada em laudo pericial contábil que ateste a veracidade dos valores consolidados na NFLD (Notificação Foscal de Lançamento de Débito).

Os municípios do Paraná, dentre outros, sofrem, em especial nos últimos dez anos, com agravante nos últimos cinco, com acentuada redução de receitas e fluxo de caixa para quitar folha de pagamento dos funcionários, repasses a fundações de saúde, conservação, manutenção e reparo de rodovias, saneamento básico, educação, etc. Paulatinamente, os municípios estão ficando sem condições financeiras para cumprirem sua função social.

Na esteira de entendimento da Procuradoria Regional da República, através do insígne Procurador-regional Brasilino Pereira dos Santos, o bloqueio é ilegal e inconstitucional, conforme seu parecer, in verbis:

"Ainda que fosse constitucionalmente autorizada a retenção, para a garantia de créditos de autarquia previdenciária, de quota-parte dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios, esta não poderia ser feita sem prévio ato devidamente fundamentado e sem o devido processo legal, para apuração da certeza e liquidez do débito, mediante processo administrativo ou judicial, assegurada a observância dos princípios do contraditório e da amplitude de defesa, na forma do art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal.

A EC nº 3, de 17.03.93, de modo inconstitucional (porque atropelou a autonomia dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal), deploravelmente mandou acrescentar um § 4º ao art. 167, in verbis:

"É PERMITIDA A VINCULAÇÃO DE RECEITAS PRÓPRIAS GERADAS PELOS IMPOSTOS A QUE SE REFEREM OS ARTS. 155 E 156, E DOS RECURSOS DE QUE TRATAM OS ARTS. 157, 158 E 159, I, "A" E "B", E II, PARA A PRESTAÇÃO DE GARANTIA OU CONTRAGARANTIA À UNIÃO E PARA PAGAMENTO DE DÉBITOS PARA COM ESTA (ART. 1º)." (ROQUE ANTÔNIO CARRAZZA – CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO).

Por maltratar o princípio da autonomia financeira das unidades da federação, "não é possível, a partir de direitos contidos na Constituição, que a União ou um Estado governem de fora para dentro do Município." (PAULO BONAVIDES, em Parecer citado por DIETER BRÜL, Professor da Universidade de Oldemburg, Alemanha, in "A Constituição de 1988 e os Municípios Brasileiros", Revista de Informação Legislativa, nº 118, pp. 42-49).

INCONSTITUCIONAL É A INCLUSÃO DAS AUTARQUIAS ENTRE AS ENTIDADES DESTINATÁRIAS DA NORMA DE EXCEÇÃO PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 160 DA CONSTITUIÇÃO DE 1988, POR FORÇA DA REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 3, DE 17.03.93, POIS ISTO CONTRARIA O PRINCÍPIO FEDERATIVO, AO SUBORDINAR OS INTERESSES DOS MUNICÍPIOS E DOS ESTADOS AOS DE SIMPLES AUTARQUIAS, ENTIDADES ADMINISTRATIVAS SUBALTERNAS CRIADAS POR LEI, E QUE POR ISSO NÃO PODEM SER ALÇADAS A UMA POSIÇÃO HIERÁRQUICA SUPERIORA À DAS UNIDADES DA FEDERAÇÃO.

NA ESFERA DE SEUS PECULIARES INTERESSES, DE SUA AUTONOMIA POLÍTICA, ADMINISTRATIVA E FINANCEIRA, ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, O MUNICÍPIO, COMO UNIDADE DA FEDERAÇÃO, É TÃO SOBERANO E INDEPENDENTE DA UNIÃO, QUANTO ESTA É RELATIVAMENTE A ELE, NÃO PODENDO, POR ISSO, SOFRER INTERVENÇÃO POR ENTIDADE AUTÁRQUICA, AINDA QUE UTILIZANDO-SE DA UNIÃO OU DO ESTADO, FAZENDO AS VEZES DE MANDATÁRIOS, PARA FINS DE COBRANÇA DE SEUS CRÉDITOS, QUE, POR MAIS PRIVILEGIADOS QUE SEJAM, NÃO JUSTIFICAM A RETENÇÃO OU QUALQUER RESTRIÇÃO À ENTREGA DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO NO PRODUTO DE IMPOSTOS QUE LHES PERTENCE.

Sendo inadmissível, no sistema federativo, a intervenção federal (da União) em Município, muito menos é possível a intervenção de autarquia federal em Município, o que, na prática, acontece em caso de débito de Município para com autarquia federal, pois neste caso a retenção e destinação diversa, ainda que contra a vontade do Chefe do Poder Executivo local, configura verdadeiro afastamento dele de suas funções de administrador das rendas pertencentes ao Município, que configura inegavelmente frontal violação ao disposto nos arts. 34 e 35 da Constituição Federal.

Se o princípio federativo é tão prestigiado que, conforme a Constituição Federal, compreende o obrigatório respeito ao princípio da autonomia municipal, sob pena acarretar até mesmo a intervenção federal no estado, sendo até classificado como princípio constitucional sensível, isto é, a cuja inobservância o Constituinte não se limitou a sancionar com a sanção de nulidade, indo além, autorizando a penalidade máxima, o afastamento e substituição do governador por um interventor no estado, conclui-se facilmente que a emenda constitucional tendente a abolir este princípio não pode ser admitida nem para discussão.
- Parecer pelo deferimento da segurança".

Desta forma, os municípios podem e devem requerer perícia extrajudicial para instaurar o contraditório, comprovando eventual iliquidez do pretenso débito fiscal consolidado.

Santo Antônio da Platina, 03/03/2006

RONILDO DA C MANOEL

CRC/PR 050.461/O-1

Consultor Tributário

LAÉRCIO ADEMIR DOS SANTOS

OAB/PR 6.576

Tributarista

FPM - Fundo de Participação dos Municípios

O Fundo de Participação dos Municípios tem sido reduzido paulatinamente nos últimos 10 (dez) anos. Para os municípios pequenos, com população abaixo de 10.000, na maioria das vezes a principal ou a maior receita é o FPM.
Para não descumprir a LRF, muitos prefeitos precisam ponderar melhor o seu papel de administrador ou gestor público. Há muitas formas de efetivar uma gestão responsável com eficiência e eficácia, reaprendendo a administrar a coisa pública.
Uma das formas de melhor gerir o patrimônio alheio é buscar receitas ocultas, que aparentemente não estão sendo contabilizadas. A revisão criteriosa do FPM pode trazer, nos últimos 10 (dez) anos, valores de receitas vultosas que se tornarão fluxo de caixa e não meramente receitas, se forem corretamente contabilizadas, seguindo os Princípios Fundamentais e Normas Brasileiras de Contabilidade e Lei 4.320/64.
Somando-se ao FPM (repasses nomais), há o repasse proveniente do PAES (Parcelamento Especial) em 2003. Todas as indústrias ou comércio em geral que não tinham condições de pagar seus débitos à vista junto à Receita Federal (IPI, IRPJ, PIS, COFINS, CSLL, etc) recorria este parcelamento especial. Ocorre que a Receita não estava preparada para a individualização das cotas fiscais, ou seja, não conseguiu individualizar cada tipo de tributo parcelado. Desta forma, formou-se um bolo único contendo recursos de débitos fiscais inadimplentes do IPI, IR, CSLL, COFINS, PIS... Na prática, o FPM é composto tão-somente pelo IPI e IR (22,50% do total vão para os municípios), conforme art. 159, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal, que dispõe:

“Art. 159. A União entregará:
I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e
sobre produtos industrializados, quarenta e sete por cento na seguinte forma:
a) [...];
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios; (...)“.
De acordo com informações do TCU, o montante do FPM é constituído de 22,5% da arrecadação líquida (arrecadação bruta deduzida de restituições e incentivos fiscais) do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza – IR e do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, conforme demonstrado a seguir:
* - Arrecadação Bruta = IR + IPI;
* - Arrecadação Líquida = Arrecadação Bruta – Deduções (Restituições, Incentivos Fiscais);
* - FPM Total = 22,5 % da Arrecadação Líquida (Receita Líquida Arrecadada) Tribunal de Contas da União.
A arrecadação bruta do IR e do IPI é apurada decendialmente pela Secretaria da Receita Federal – SRF, que deduz as restituições e incentivos fiscais (FINOR, FINAM, FUNRES, PIN e PROTERRA) ocorridas no mesmo período e comunica o montante da arrecadação líquid a resultante à Secretaria do Tesouro Nacional – STN. Esta Secretaria, por sua vez, procede a contabilização dessas arrecadações líquidas no Sistema Integrado de Administração Financeira
do Governo Federal – SIAFI, informando, em seguida ao Banco do Brasil o montante financeiro a ser transferido que corresponde a 22,5% da arrecadação líquida contabilizada. Esses valores são transferidos aos municípios observados os coeficientes individuais de participação no FPM fixados em Decisão Normativa específica do TCU .
Portanto, a revisão fiscal do s repasses do FPM é imprescindível, junto ao TCU e IBGE.
Desta forma, obter-se-á a certeza dos repasses corretos. Algumas formas de revisão são imprescindíveis:
a) - informações censitárias junto ao IBGE;
b) - ganho adicional e redutor financeiro, previsto pela LC 91/97 -

De acordo com a Lei Complementar nº 91/97, para aqueles Municípios cujo coeficiente vigente em 1997 for maior do que o verificado com base na tabela acima (coeficiente populacional), caberá um ganho adicional que consistirá na diferença entre o coeficiente de 1997 e o coeficiente populacional. Por exemplo: Um Município que apresentava um coeficiente de 3,0 em 1997 teve uma diminuição do número de seus habitantes de tal modo que, de acordo com os dados populacionais informados pela Fundação IBGE e a aplicação das faixas de número de habitantes do Decreto-Lei n.º 1.881/81, teria seu coeficiente no valor de 2,2 para o exercício de 2005. Pela aplicação da Lei Complementar n.º 91/97, o seu coeficiente populacional deve permanece com o valor de 1997 (3,0), visto que este é superior ao coeficiente calculado exclusivamente com base do Decreto-Lei n.º 1881/81 (2,2).
Entretanto, observe-se que os Municípios que tem ganho adicional, também designados como “amparados” pela Lei Complementar n.º 91/97, estão sujeitos à aplicação de redutor financeiro sobre a parcela de ganho adicional.
Os demais Municípios, os “não-amparados” pela Lei Complementar n.º 91/97, isto é, aqueles que não apresentam ganho adicional e, assim, não estão sujeitos à aplicação de redutor financeiro, são beneficiários da redistribuição do valor retirado (reduzido) dos Municípios amparados, conforme prescreve o art. 2º daquela Lei.
O valor total a ser redistribuído aos entes não-amparados é dado pela diferença entre o somatório dos ganhos adicionais e o somatório dos ganhos adicionais ajustados. Essa diferença representa o valor que, no total, foi reduzido dos Municípios amparados. A parcela a ser redistribuída a cada um dos entes não-amparados é feita proporcionalmente ao coeficiente
populacional de cada Município não-amparado, resultando no valor final do coeficiente no FPM (coeficiente populacional + parcela redistribuída).
Em síntese, o coeficiente final para os Municípios amparados é expresso pela soma do coeficiente populacional e do ganho adicional ajustado (após o desconto promovido pelo redutor financeiro). Para os não-amparados, é dado pela soma do coeficiente populacional e da parcela a redistribuir. (conforme informações do TCU).
c) - Distribuição financeira para os municípios do interior - uma síntese do cálculo de distribuição financeira de recursos do FPM para os Municípios do Interior seria V = (C x (PE x FPM-Int) ) / S onde: V = Valor da cota do Município; C = Coeficiente individual do Município; PE = percentual de participação do Estado de origem no FPM-Interior; FPM-Int = valor financeiro do FPM destinado aos Municípios do Interior (86,4 % do montante do FPM Total ); S = Somatório de coeficientes de todos os Municípios do Estado.
c) - Distribuição financeira para os municípios da capital - fator população e renda per capita;
d) - COEFICIENTES DOS MUNICÍPIOS DA RESERVA
Os Municípios participantes dos recursos da Reserva são aqueles com população superior a 142.633 habitantes, ou seja, os Municípios enquadrados nos coeficientes 3,8 e 4,0 da tabela de faixas de habitantes do Decreto-lei n.º 1.881/81. A Reserva foi instituída pelo art. 2º do Decreto-lei n.º 1.881/81 e corresponde a 4% do valor do FPM destinado aos Municípios do interior. Destaque-se que os Municípios participantes dos recursos da Reserva também são participantes da distribuição do Interior. A distribuição dos recursos da Reserva baseia-se em coeficientes calculados a partir da população de cada Município participante e da renda per capita do respectivo Estado, as quais são informadas pelo IBGE (Lei n.º 5.172/66 - Código Tributário Nacional e Decreto-lei n.º 1.881/81). Da mesma forma que para os grupos “Interior” e “Capitais”, a partir do exercício de 1998, a cada participante foi garantido, no mínimo, o mesmo coeficiente atribuído no exercício de 1997. Todavia, os ganhos adicionais, em relação aos coeficientes legalmente indicados, estão sujeitos a redutor financeiro (LC n.º 91/97, art. 3º, § 2º).

A incidência do redutor varia de acordo com a condição que levou cada ente a integrar o grupo “Reserva”. O requisito para um Município participar da “Reserva” é o de possuir coeficiente populacional no valor de 3,8 ou 4,0 (LC n.º 91/97, art. 3º, § 1º), o que obriga à análise das seguintes possibilidades:
1) o Município atende ao requisito nos dias atuais e possui coeficiente da Reserva apurado em valor igual ou superior ao de 1997. Não há, pois, incidência de redutor. Essa é a situação mais comum encontrada no cálculo dos coeficientes da Reserva.
2) o Município é amparado pela Lei Complementar n.º 91/97, tendo o coeficiente de 1997 mantido por força da Lei. Contudo, o Município só atende ao requisito para ingresso no grupo “Reserva” no ano de 1997, mas não possui na atualidade população suficiente para auferir coeficiente no valor de 3,8 ou 4,0, com base nas faixas de número de habitantes do Decreto-lei n.º 1881/81. Nesse caso, o redutor incidirá sobre o total do valor do coeficiente de 1997, considerado por inteiro como ganho adicional, para efeito de simplificação.
3) o Município atende ao requisito nos dias atuais, ou seja, possui na atualidade população suficiente para auferir coeficiente no valor de 3,8 ou 4,0, com base nas faixas de número de habitantes do Decreto-lei n.º 1881/81. Entretanto, o ente é amparado no que tange ao coeficiente da Reserva, por possuir valor apurado inferior ao correspondente em 1997. O redutor incidirá, pois, apenas sobre o ganho adicional (a diferença entre esses dois valores).

CONSTESTAÇÃO DAS COTAS FIXADAS PELO TCU

Os Municípios podem contestar os cálculos efetuados pelos TCU, ocorrendo preclusão desse direito após um mês da publicação dos coeficientes no Diário Oficial da União, bem como denunciar ao Tribunal quando os recursos recebidos não corresponderem aos seus respectivos coeficientes, observando-se que 15% dos montantes calculados para o FPM são destinados ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – FUNDEF, de acordo com o art. 1º, § 1º da Lei n.º 9.424/96, e/ou quando houver atraso no repasse dos valores devidos, exceto nos casos de bloqueio das quotas dos fundos de participação.
Portanto, o administrador reponsável ficará atento aos seus direitos e obrigações que abrangem os direitos de todos os munícipes, que podem ser prejudicados pela ausência parcial ou total de recursos financeiros, sejam advindos do FPM ou de outras fontes.
Santo Antônio da Platina/PR, 03/03/2006.
RONILDO DA C MANOEL
CRC/PR 050.461/O-1
Consultor Tributário
Pareceirista fiscal
FABRÍCIO MORENO
CRC/PR 041897/O-7
Consultor, Auditor e Perito
Tributário e Fiscal

Taxa ou Tarifa de água e esgoto e sua prescrição

Este parecer foi fornecido ao Dr. Rui Eduardo Abrantes, procurador autárquico - Uberlândia/MG:

"Dr. Rui Eduardo Abrantes, muito nos honra sua consulta.
Nosso parecer baseia-se em algumas decisões do STJ, tendo em vista às controvérsias ao redor do tema "tarifa de água". Afinal, o valor cobrado pelo fornecimento do serviço de água e esgoto é taxa ou preço público? De acordo com o colendo Superior Tribunal de Justiça, se não houve contraprestação do serviço por parte da concessionária responsável, então trata-se de preço público.
Portanto, não tendo característica de tarifa, a vigência passa a ser do CCB, Art. 103, verbis: "uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem".
Destacamos, portanto, extrato da ementa do REsp 480.692/MS, relator Ministro Luiz Fux, verbis:

"4. O serviço de fornecimento de água e esgoto é cobrado do usuárioPela entidade fornecedora como sendo taxa, quando revelaCompulsoriedade. 2. Trata-se no caso em exame, de serviço públicoConcedido, de natureza compulsória, visando atender necessidadesColetivas ou públicas. 3. Não tem amparo jurídico a tese de que adiferença entre taxa e preço público decorre da natureza da relaçãoEstabelecida entre o consumidor ou usuário e a entidade prestadoraOu fornecedora do bem do serviço, pelo que, se a entidade que prestaO serviço é de direito público, o valor cobrado caracterizar-se-iaComo taxa, por ser a relação entre ambos de direito público; aocontrário, sendo o prestador do serviço público pessoa jurídica deDireito privado, o valor cobrado é preço público/tarifa. 4.Prevalência no ordenamento jurídico das conclusões do X SimpósioNacional de Direito Tributário, no sentido de que "a naturezajurídica da remuneração decorre da essência da atividadeRealizadora, não é afetada pela existência da concessão. Oconcessionário recebe remuneração da mesma natureza daquela que oPoder Concedente receberia, se prestasse diretamente o serviço".(RF, julho a setembro. 1987, ano 1897, v.299, p.40). 5. O art. 11,Da Lei nº 2312, de 3.09.94 ( Código Nacional de Saúde) determina: "ÉObrigatória a ligação de toda construção considerada habitável àRede de canalização de ESGoto, cujo afluente terá destino fixadoPela autoridade competente". (...) 7. Obrigatoriedade do serviço deágua e esgoto. Atividade pública (serviço) essencial posta àdisposição da coletividade para o seu bem estar e proteção àsaúde, (...)" .(RESP 167489/SP, Rel. Min. José Delgado, DJ24/08/1998)".

Outra jurisprudência interessante, para dirimir possíveis dúvidas, é justamente a extraída do REsp 439.570/DF, relator Ministro Luiz Fux, verbis:

"PROCESSUAL CIVIL - TARIFA DE ESGOTO - NATUREZA
JURÍDICA DA RELAÇÃO ENTRE CONCESSIONÁRIA E
EMPRESA - PRESCRIÇÃO - SERVIÇO PÚBLICO -
COMPULSORIEDADE DO SERVIÇO - CONTRAPRESTAÇÃO
INEXISTENTE - RELAÇÃO CONTRATUAL - TAXA - SUBMISSÃO
AOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS TRIBUTÁRIOS - INOCORRÊNCIA
IN CASU - ATO UNILATERAL DA CONCESSIONÁRIA QUE
SUSPENDEU A COBRANÇA DA TARIFA CONSIDERADA ILEGAL
- REPETIÇÃO DO INDÉBITO - RELAÇÃO DE DIREITO PRIVADO
- PRAZO PRESCRICIONAL VINTENÁRIO
1. A controvérsia acerca da natureza jurídica do preço de um serviço
público, sobre ser taxa, preço público ou tarifa, pressupõe a existência da
Atividade "em ato" ou "em potência".
2. Engendrada a cobrança em local onde o serviço sequer existia, o que
Assoma é a figura da apropriação indevida pelo concessionário, recebendo
Torpe locupletamento. Nessas hipóteses, ausente o fato gerador, o que
Ocorreu foi enriquecimento ilícito passível de ser coibido por ação de
repetição de prescrição vintenária na forma da Súmula 39 do STJ.
3. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nessa parte, provido".

ACREDITAMOS QUE para ficar mais claro e conciso, há de obtemperar-se a própria conclusão acertada do Ministro relator Luiz Fux, REsp 480.692/MS:

"(...) O que caracteriza a remuneração de uma serviço público como taxa
Ou como preço público é a compulsoriedade, para a taxa, e a
Facultatividade para o preço, conforme já decidiu o Supremo Tribunal
Federal. Importante, porém, é a compreensão adequada, que se há de ter,
Do que sejam essa compulsoriedade e essa facultatividade.
A título de exemplo, imaginemos a necessidade que se tem de energia
elétrica. S o ordenamento jurídico nos permite atender a essa necessidade
Com a instalação de um grupo gerador em nossa residência, ou
Estabelecimento industrial ou comercial, então a remuneração que o
Estado nos cobra pelo fornecimento de energia é um preço público, pois
não somos juridicamente obrigados a utilizar o serviço público para a
satisfação da nossa necessidade. Embora nos seja mais conveniente a
utilização do serviço público, do ponto de vista econômico ou por outra
razão qualquer, do ponto de vista rigorosamente jurídico nada nos impede
De, por outro meio, atender à necessidade de energia elétrica. A
remuneração que pagamos pelo serviço de energia elétrica, portanto, não é
compulsória. Por outro lado, se há norma jurídica proibindo a instalação
De grupo gerador ou unidade de captação de energia solar em residências
Ou estabelecimentos comerciais ou industriais, de sorte que o atendimento
Da necessidade de energia elétrica por qualquer outro meio que não seja o
serviço público torna-se impossível sem violação da ordem jurídica, tem-se
Que a utilização do serviço, e por isto mesmo o pagamento da remuneração
Correspondente é compulsória. Neste caso, essa remuneração
Correspondente é taxa.
O mesmo não pode ser dito do serviço de água e esgoto. Se há norma
Proibindo o atendimento da necessidade de água e esgoto por outro meio
Que não seja o serviço público, a remuneração correspondente é taxa. Se a
Ordem jurídica não proíbe o fornecimento de água em pipas, nem o uso de
Fossas, nem o transporte de dejetos em veículos de empresas especializadas,
Nem o depósito destes em locais para esse fim destinados pelo Poder
Público, ou adequadamente construídos pela iniciativa privada, então a
Remuneração cobrada pelo serviço público de fornecimento de água e
Esgoto é preço público. Se, pelo contrário, existem tais proibições, de sorte
A tornar o serviço público o único meio de que se dispõe para o
Atendimento da necessidade de água e esgoto, então a remuneração
Respectiva será taxa.
Essa é a conclusão a que se chega da análise de memorável acórdão
Do Supremo Tribunal Federal que apreciou questão relativa à cobrança de
remuneração pela coleta de lixo do então Estado da Guanabara. Como a
legislação daquele Estado proibia o uso de todo e qualquer meio para o
Atendimento da necessidade de livrarem-se as pessoas do lixo produzido em
Suas residências ou em suas atividades profissionais, tornando obrigatório,
Assim, o uso do serviço prestado pela empresa estatal criada para esse fim,
A remuneração que vinha sendo cobrada como preço público foi
Considerada como taxa pela Corte Maior.
É importante compreender o fundamento dessa idéia.
Se a ordem jurídica obriga a utilização de determinado serviço, não
Permitindo o atendimento da respectiva necessidade por outro meio, então
é justo que a remuneração correspondente, cobrada pelo Poder Público,
Sofra as limitações próprias dos tributos. O contribuinte estará seguro de
Que o valor dessa remuneração há de ser fixado por critérios definidos em
Lei. Terá, em síntese, as garantias estabelecidas na Constituição.
Por outro lado, se a ordem jurídica não obriga a utilização do
serviço público, posto que não proíbe o atendimento da correspondente
Necessidade por outro meio, então a cobrança da remuneração
Correspondente não ficará sujeita às restrições do sistema tributário. Pode
Ser fixada livremente pelo Poder Público, pois o seu pagamento resulta de
Simples conveniência do usuário do serviço.
À liberdade que tem o Poder Público na fixação do preço público
Corresponde a liberdade do cidadão de utilizar, ou não, o serviço
Correspondente. Se o cidadão não tem essa liberdade, o Poder Público deve
Estar igualmente limitado pela ordem jurídica no pertinente aos critérios
Para fixação do valor a ser cobrado, que será um tributo." (in Curso de
Direito Tributário, Editora Malheiros, 20ª Edição, págs. 376/379)
Nesse sentido, posicionou-se o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE
N. 54.194, da Relatoria do e. Min. Luis Gallotti, publicado no DJ de 28.11.63, cuja ementa
Merece transcrição:
TAXA DE ÁGUA E ESGOTO. É UMA TAXA TÍPICA, COMO ESTÁ
APONTADA PELA GENERALIDADE DOS MESTRES DE DIREITO
FINANCEIRO E DIREITO TRIBUTÁRIO; ASSIM, SUA MAJORAÇÃO
DEPENDE DE LEI.
Delegações legislativas admitem-se em matéria econômica
(tabelamento de preços, etc), não em matéria tributária. A
Possibilidade de delegações legislativas na órbita tributária está
excluída não só pela regra contida no art. 36 par 2 da Constituição,
Mas de modo especial e enfático pelo par 34 do art. 141, o qual, no
tocante aos tributos (impostos, contribuições e taxas), dispõe que
nenhum será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça e
nenhum será cobrado em cada exercício sem prévia autorização
orçamentária, ressalvados apenas o imposto por motivo de guerra e a
tarifa aduaneira. Nem houve, no caso, delegação ao poder executivo,
pois o Dec. lei estadual 1.413 de 13.7.46, invocado pelo recorrido, e
anterior à Constituição de 1.946 é da competência ao chefe do
governo, mas isso a um tempo em que o chefe do governo acumulava
as funcões executivas e legislativas.
DIFERENÇA ENTRE TAXAS E PREÇOS CONTRATUAIS DE
SERVIÇOS PÚBLICOS (TARIFAS).
O problema não se modifica por se tratar de uma autarquia, porque,
ao constituí-la o estado personificou esse órgão da Administração
local, houve uma descentralização, mas com isso não se alienou o
caracter público do serviço. Trata-se de órgão paraestatal, a quem o
Estado cede uma parte do seu imperium.
A destinação especial, não descarateriza os tributos tornam-se então
tributos ligados, conforme e terminologia Alemã. O fato de ser
delegado o tributo a um serviço descentralizado, a uma autarquia, não
lhe altera a natureza.
Se a taxa não deixa de o ser pelo fato de só se tornar devida quando
voluntariamente utilizado o serviço, força é concordar que, quando
imposta por motivos de interesse publico (saúde, higiene, etc.)
independentemente daquela utilização, o seu caracter tributário se
torna indiscutível.
Na taxa ha um benefício especial mensurável e um interesse
predominante. No preço pblico, o pagamento é feito por um serviço ou
mercadoria do governo, em primeiro lugar para um benefício especial
do indivíduo e secundariamente no interesse da comunidade.
Não há como equiparar a taxa de água e esgoto as chamadas taxas
correspondentes à utilização de aeroporto (decreto lei n 9.792 de
1.946), que o Supremo Tribunal considerou preços públicos (tarifas),
conforme as denomina o próprio Dec. lei em vários dos seus
preceitos."
No mesmo sentido, é o posicionamento majoritário da doutrina, conforme
noticiado no voto-condutor do RESP n. 167489/SP, supracitado, da relatoria do e. Min. José
Delgado, dentre as quais, destacam-se, as seguintes obras:
a) Geraldo Ataliba, in "Abastecimento de Água - Serviço Público Delegado -
Taxa" (Rev. Dir. Adm. vol. 186, out/dez, 1991, p. 315-333);
b) Aurélio Pitanga Seixas Filho, in "Caracteres Distintos da Taxa e do Preço
Público" (Ver. Forense, vol. 323, Ano 89, jul/set, p. 46-54);
c) Hugo de Brito Machado, in "Taxa e Preço Público" (Caderno de Pesquisas
Tributárias n. 10., p. 133-151);
d) Marco Aurélio Grecco, in "Distinção Jurídica entre Taxa e Preço (Tarifa)",
(RT, ano 62, out. 1973, vo,l. 456, p. 39-44);
e) Carlos da Rocha Guimarães, in "Taxa e Preço Público" (Caderno de Pesquisas
Tributárias, n. 10, p. 39-45);
f) Ives Gandra da Silva Martins, in "Taxas e Serviço Público", (Caderno de
Pesquisas Tributárias, n. 10, p. 154-186);
g) Toshio Mukai, in "Taxa e Preço Público" (Caderno de Pesquisas Tributárias, n.
10, p. 239-250);
h) Zelmo Delari, in " Taxas e Preços, (Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 10, p.
232-348);
Por conseguinte, resta evidente o entendimento de que a taxa, sendo uma espécie
do gênero tributo, segue os princípios tributários que lhes são inerentes.
In casu, agiu com acerto o Tribunal a quo ao considerar que em razão de a tarifa
de esgoto possuir natureza de taxa e, portanto, de tributo, está subordinada ao Princípio da
Estrita Legalidade.(...)".

Portanto, inferimos que:
A) - quando se tratar de taxa, os serviços de água e esgoto, por sua compulsoriedade, conforme doutrina inserta no REsp alhures evidenciado e as devidas fundamentações legais e constitucionais, então a prescrição está atrelada ao direito tributário, ou seja, cinco (05) anos para a cobrança do indébito, tendo em vista que a taxa de água e esgoto não é tributo por homologação mas meramente lançamento;
B) - se a taxa foi julgada inconstitucional pelo STF, então o início do prazo prescricional de 5 (cinco) anos ocorre com a declaração de inconstitucionalidade, com a publicação do acórdão que declarou inconstitucional determinada norma tributária ou, ainda, com o trânsito em julgado do referido acórdão, pois estaria aí a actio nata.Nasceria, nesse momento, o direito dos contribuintes a pleitearem a devolução de tributo que foi por eles recolhido. (No entanto, quando uma norma tributária é declarada inconstitucional pelo STF através do controle difuso, no julgamento de um recurso extraordinário, a situação é bastante diferente e precisa ser levada em conta.Essa decisão tem efeitos apenas entre as partes envolvidas naquela demanda, não podendo ser aproveitada por outros contribuintes. A declaração de inconstitucionalidade proferida no controle difuso somente produzirá efeitos erga omnes, ou seja, somente atingirá todos os destinatários daquela norma, entre outros casos, no momento em que for expedida Resolução do Senado Federal, prevista no art. 52, inciso X, da Constituição, através da qual será suspensa a execução da legislação inconstitucional.)
C) - se é mero preço público, pois o consumo de água ou a utilização do esgoto não é compulsório, então a prescrição é vintenária, tendo em vista que passa a ser uma ação pessoal pela locupletamento de seu patrimônio pessoal. Aplicam-se os dispositivos do Art. 2.035 c/c 2.045 do novo CCB. Há algumas doutrinas e decisões jurisprudenciais (minoritárias) que defendem 10 (dez) anos, conforme art. 205 CCB).
D) - Entendimento novo, a partir da vigência da LC 118/2005 do STJ:
RECURSO ESPECIAL Nº 740.639 - SP (2005/0058579-4)
RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE : W ZANONI E COMPANHIA LTDA
ADVOGADO : JOSÉ ROBERTO MARCONDES E OUTRO
RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : NAIARA PELLIZARO DE LORENZI CANCELLIER E OUTROS
"TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TRIBUTO SUJEITO
A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO.
NOVA ORIENTAÇÃO FIRMADA PELA 1ª SEÇÃO DO STJ NA
APRECIAÇÃO DO ERESP 435.835/SC. LC 118/2005: NATUREZA
MODIFICATIVA (E NÃO SIMPLESMENTE INTERPRETATIVA)
DO SEU ARTIGO 3º. INCONSTITUCIONALIDADE DO SEU
ART. 4º, NA PARTE QUE DETERMINA A APLICAÇÃO
RETROATIVA. ENTENDIMENTO CONSIGNADO NO VOTO DO
ERESP 327.043/DF.
1. A 1ª Seção do STJ, no julgamento do ERESP 435.835/SC, Rel. P/
O acórdão Min. José Delgado, sessão de 24.03.2004, consagrou o
Entendimento segundo o qual o prazo prescricional para pleitear a
restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de
Cinco anos, contados da data da homologação do lançamento, que, se
For tácita, ocorre após cinco anos da realização do fato gerador —
Sendo irrelevante, para fins de cômputo do prazo prescricional, a
Causa do indébito. Adota-se o entendimento firmado pela Seção, com
Ressalva do ponto de vista pessoal, no sentido da subordinação do
Termo a quo do prazo ao universal princípio da actio nata (voto-vista
Proferido nos autos do ERESP 423.994/SC, 1ª Seção, Min. Peçanha
Martins, sessão de 08.10.2003).
2. O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar os arts. 150, §
1º, 160, I, do CTN, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um
Alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável
A “interpretação” dada, não há como negar que a Lei inovou no plano
Normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus
Sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ,
intérprete e guardião da legislação federal. Portanto, o art. 3º da LC
118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, Incidindo apenas sobre
situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.
3. O artigo 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a
aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos
Passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e
independência dos poderes (CF, art. 2º) e o da garantia do direito
Adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º,
XXXVI). Ressalva, no particular, do ponto de vista pessoal do relator,
No sentido de que cumpre ao órgão fracionário do STJ suscitar o
Incidente de inconstitucionalidade perante a Corte Especial, nos
Termos do art. 97 da CF.
4. Recurso especial a que se dá parcial provimento.".
Ou seja: a partir da vigência da LC 118/2005, o STJ entende que a prescrição é tão-somente de cinco (05) anos.

É o nosso parecer".

Ibaiti/PR, 03/03/2006

LAÉRCIO ADEMIR DOS SANTOS
Tributarista
OAB/PR 6.576


RONILDO C MANOEL
CRC/PR 050.461/O-1
Consultor fiscal-tributário


FABRÍCIO MORENO
CRC/PR 041897/O-7
Perito-Contador
Consultor Tributário